Qual a sua motivação para viajar?
A resposta pra essa pergunta parece ser óbvia, mas em alguns casos é bem mais complexa.
Descansar, visitar um amigo, conhecer um museu, ver aquele monumento famoso... essas motivações certamente se encaixam nas categorias mais comuns entre aquelas que fazem alguém sair de casa e ir pra um lugar novo.
Mas muita gente resolve comprar uma passagem e entrar num avião rumo ao desconhecido pra fazer coisas que pouca gente imaginaria. Hoje nós vamos começar uma série bem legal aqui no Viagem Criativa pra conhecer um desses casos, que rendeu uma grande quantidade de histórias.
A Daniele Lieuthier mora em Curitiba e trabalhava no mercado publicitário. Não é raro vermos alguém desse ramo simplesmente "surtar" e sair em busca de algo que as faça sentir vivas. Acredite: eu sei, o mesmo aconteceu comigo quando decidi criar esse blog e sair viajando.
Enfim, a Daniele sempre foi fanática pelo mundo dos chás. Ela decidiu se especializar no assunto e abrir a sua própria casa chá, a Caminho do Chá, lá na capital do Paraná. Como? Da maneira mais legal possível: viajando!
Ela ficou inacreditáveis 9 meses rodando o planeta e conhecendo as mais diferentes culturas do chá. Nesse rolê todo ela passou por Turquia, França, Inglaterra, Geórgia, Tailândia, China, Taiwan e Marrocos. Dá pra imaginar quantas coisas incríveis ela viveu nesse período?
Vamos começar falando um pouco sobre o que ela viu, aprendeu e sentiu durante a passagem pela Turquia. Boa viagem! :D
Quatro meses, quatro empregos, quatro casas, duas cidades, um rolé pelo Mar Negro, muitas plantações de chá.
Assim se resumem os quatro meses que passei na Turquia.
Dia inesquecível com direito a vista com arco-íris duplo, plantações de chá nas montanhas e Mar Negro ao fundo. <3
Mas que dinâmica, não? Sim! E olha que essa parte não foi tanto assim. Esses meses na Turquia foram parte de uma viagem que fiz pelo mundo para pesquisar sobre chás, a Caminho do Chá.
Foram nove meses, passando por oito países diferentes, na Europa, Ásia e África.
Colhendo chá verde selvagem em Ningguo, China.
Comecei fazendo pesquisa de mercado em Paris e Londres. Uma semana em cada, comendo muito bolo e tomando muito chá. Foi um início de viagem incrivelmente delicioso, gordinho e caro.
Depois de passar duas semanas comendo like a boss (mas hospedada na casa de amigas), chegou a hora de fechar a torneirinha do dinheiro (gastei mais em 12 dias de orgias gastronômicas na Europa que em 40 dias na Tailândia, mas isso fica pro próximo post).
Misty Island: manga flambada com crumble, sorvete de côco com jasmim e coulis de maracujá. Melhor doce que já comi na vida. Mariages Frères, Paris.
Quanto mais você viaja, mais fácil viajar fica. Digo isso não só pela experiência e "guts" que você vai adquirindo entre pousos e aterrissagens, mas também pela incrível e maravilhosa rede de contatos que vai fazendo.
De Londres, fui pra Istambul, e fui muito bem recebida por uma amiga turca, a Sinem, que tinha sido minha roommate durante duas semanas, quando morei em Buenos Aires, em 2010/11.
Essa é a minha amiga Sinem. E esse é o gato folgado que achamos no banheiro da universidade onde ela estuda.
A Sinem e o Çinar, seu namorado na época, me receberam muito bem. Já nos primeiros dias, me apresentaram para várias comidas típicas, costumes locais, literatura (Orhan Pamuk, gênio!), músicas étnicas esquisitas e outras curiosidades.
É muito legal conviver com nativos.
Yenisei Punk. Essa é uma música de um grupo étnico que faz uns sons muito esquisitos com a garganta.
Na troca cultural, mostrei um vídeo do É o Tchan, dançando a Boquinha da Garrafa. Não sei quem ficou mais assustado! Hahaha
No segundo dia, fui para o centro histórico fazer passeio de turista: tomar chá, visitar a Mesquita Azul, comer kebab e visitar o Mercado das Especiarias.
Uma amiga tinha me contado que eles têm vários chás diferentes lá. Decidi tentar procurar um trabalho.
Apple tea com a famosa Mesquita Azul ao fundo (e no reflexo no copinho! :D )
O bom é que ali, você não precisa tentar puxar papo com ninguém.
Você anda pelo corredor e os vendedores, como abutres vendo carne fresca desfilando, fazem de tudo para chamar sua atenção e levar você pra dentro das lojas.
Já me fisgaram em uma das primeiras. “Ô, brasileira? Pelé! Futebol! (eles falaram em português, mesmo) Do you know Felipão? Felipão is my customer. Come here, I’ll show you a picture.” (Você conhece o Felipão? O Felipão é meu cliente. Vem aqui, te mostro a foto.”)
Esse é o Menderes, gerente da loja 76, e seu primo, que veio do Afeganistão pra trabalhar na Turquia. O “brimo” me contou que a vida no Afeganistão era perigosa e me mostrou uma cicatriz enorme de uma facada que levou na barriga. :O E pensar que a gente reclama da vida!
Mal cheguei e já me serviram um tradicional chá turco. Ahhh, que saudades do chá turco! <3
Perguntei se poderia trabalhar ali. Chamaram o chefão, um turco milionário que tem umas dez lojas de especiarias em Istambul.
Falei pra ele que tinha experiência em vendas, que falava português, inglês, espanhol e francês, e que poderia conversar com os turistas. Depois descobri que falar quatro línguas não era nada demais.
Tinha alguns colegas, pessoas super simples, que falavam até 6 ou 7 línguas com fluência. E vários deles são autodidatas.
E pensar que no Brasil, os comerciantes raramente falam inglês.
No Mercado de Especiarias, você encontra todo tipo de especiarias. E também vários tipo de chás!
Comecei a trabalhar no dia seguinte. Essa experiência durou dez dias. Doze horas de trabalho por dia, em pé.
A parte de ser um abutre esperando por clientes é muito chata. Mas vender era legal.
E os caras com quem eu trabalhava eram muito engraçados. Tinha de tudo: algerianos, curdos, afegãos, turcos.
No mercado inteiro, entre umas 200 pessoas, só tinha 10 mulheres. Uma delas era eu!
Levei minha câmera para o trabalho e todos os meus colegas fizeram pose pra foto! Esse é o Menderes, o gerente da loja 76.
Esse é o Hicham, francês de origem algeriana.
Esse é o Massum, que é turco.
O Dayi, que em turco, significa tio. O mais engraçado de todos. Quilos de risadas por dia com as cantadas que ele passava em todas as mulheres que cruzavam a loja!
Ruim era ter que aplicar algumas técnicas turcas de vendas que eles me ensinaram ali, como: “diz que chá de açafrão curou a sua vó de câncer.”, ou “quando a pessoa decidir comprar algo, coloca sempre mais do que ela pediu" (as vendas eram a granel).
Então, pessoal, quando forem pra Istambul, prestem atenção aos preços e à lábia dos turcos comerciantes!
Eles são muito simpáticos e divertidos! Esse jeitinho turco de vender é cultural. É a forma deles de sobreviver em um comércio tão acirrado.
Meus queridos coleguinhas! Eu era a única mulher da loja (e uma das poucas do Spice Bazaar). Eles me superprotegiam, me tratavam como irmã mais nova, regada a chás e docinhos turcos!
Era muito puxado. Um dia, voltando pra casa (aí, já tinha alugado um quarto e estava morando com dois caras turcos, amigos da minha amiga Sinem), desci do metrô e passei na frente de um café.
Vi um anúncio colado: Garson blablablabla. Pra minha sorte, garçom em turco é garson. Daí, eu entendi o anúncio. Haha! Entrei e pedi para falar com o gerente. A dona, a queridíssima Esin, estava lá.
Thank God, ela fala inglês fluente. Pedi para trabalhar. Disse que falava quatro línguas e que poderia atender os turistas. Então ela me contou que a grande maioria dos clientes ali eram turcos, e era mais importante eu falar turco do que outras línguas.
Legal, hein! Então, eu disse pra ela que tinha facilidade pra aprender línguas, que em dois dias poderia decorar todos os pratos do cardápio em turco. Ela concordou.
Esse é o börek. Hummmm! Massinha folhada com diversas possibilidades de recheio: queijo, espinafre, batata etc. Em breve, vou servir café da manhã turco na casa de chás Caminho do Chá!
Levei o cardápio pra casa e pedi para os meus roommates traduzirem tudo pra mim
Merhaba! Siparişinizi alabilirmiyim? (Oi! Posso pegar o seu pedido?).
Foi bem difícil decorar tudo. As palavras turcas são enormes. A conjugação de verbos é insana. Mas, vai, depois de quatro meses morando na Turquia, já consigo me virar.
Não morro de fome na Turquia. Principalmente, porque meu vocabulário gastronômico é bem extenso depois de ter decorado o cardápio inteiro e trabalhado por um mês no Mono Café. <3
Esse é o simit, tradicional pão turco. É delicioso e você encontra em qualquer lugar da Turquia. Nas padarias e também pelas ruas, em carrinhos como os de pipoca. Também vou servir na Caminho do Chá!! :D
As histórias são intermináveis. Que difícil sintetizar quatro meses da minha vida.
Principalmente porque eles foram muito intensos, cheios de emoções, amigos novos e lembranças lindas.
Vou parando por aqui a primeira parte sobre a Turquia! No próximo post, conto mais histórias sobre esse país lindo que conquistou meu coração.
E na sequência, conto mais também sobre os outros países para onde fui, nessa viagem maluca que fiz, Caminho do Chá.
Enquanto isso, você pode ler algumas histórias e curiosidades sobre chá aqui. Beijos e muito chá pra vocês!
Saudades de Istambul
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