O título desse post deve ser um dos mais confusos que já escrevi aqui no blog, mas pode acreditar: em poucos minutos você vai entender tudo!
Sempre que você, seu filho, neto ou qualquer outra pessoa no mundo abrir um livro de história no capítulo do século 20, pode ter certeza que Berlim estará sempre numa posição de destaque.
Segunda Guerra Mundial, Guerra Fria, Muro de Berlim, queda do bloco socialista, reunificação do país... a capital da Alemanha foi cenário de tantos eventos que ajudaram a configurar o mundo como conhecemos hoje, que qualquer pessoa minimamente interessada em história tem o desejo de visitar a cidade e ver de perto os cenários de tantos acontecimentos.
Acontece que, dependendo do ponto de vista, essa visita pode ser um pouco frustrante. Isso porque a Segunda Guerra e a queda do Muro trataram de destruir praticamente tudo que tinha pra ser visto. Boa parte dos lugares históricos não existem mais e foram reduzidos a ícones no mapa.
Obviamente, há exceções. E nem estou falando dos pedaços do Muro de Berlim que ainda sobraram de pé.
Conversando com o meu amigo Felipe Tofani, do Fostrasse, que mora em Berlim e também gosta bastante de visitar lugares menos usuais, vimos que existe um tour pelo subterrâneo da cidade, onde muita coisa da época da Segunda Guerra ainda estava muito bem conservada.
Pareceu perfeito, e lá fomos nós conhecer o Berliner Unterwelten. São vários passeios oferecidos por essa empresa, com guias em inglês e que exploram diferentes locais de grande importância histórica. Esses tours duram cerca duras horas, custam entre 10 e 15€ e ficam localizados bem ao lado da estação de Gesundbrunnen. É só verificar os horários pelo site e chegar lá no escritório deles na hora marcada.
A gente escolheu fazer a segunda tour, chamada de Flak Tower. As Flak Tower eram torres imensas, usadas como um misto de bunker, fortaleza e bateria anti-aérea. Oito complexos desse foram construídos na Alemanha - sendo três em Berlim - para abrigar civis e proteger o país de ataques.
Com o final da Segunda Guerra e a derrota alemã, as autoridades começaram a destruir essas torres, já que não havia mais necessidade de se defender. Uma a uma, elas foram derrubadas e passaram a ser apenas história nos livros.
Porém, uma dessas torres teimava em não cair de jeito nenhum. Mais especificamente, a Flakturm número III, uma fortaleza nazista localizada dentro do Humboldthain Park. Não havia jeito dos caras conseguirem destruir essa torre. Foram mais de 10 bombardeios e tentativas de implosão, todas sem sucesso.
Depois de muito tempo, o pessoal resolveu desistir e simplesmente se conformar com o fato de que teriam que conviver com essa torre pra sempre. E é assim até hoje.
Ela ficou fechada por mais de 50 anos e em 2004, passou a ser aberta para visitação do público. Foi exatamente esse passeio que fomos fazer naquela tarde.
O ponto ruim desse tour é que fotos são terminantemente proibidas. Mas assim, muito mesmo! O pessoal leva isso muito a sério e fica ameaçando expulsar do passeio quem sacar uma câmera ou um celular. Pelo que eu entendi, ninguém pode tirar fotos lá dentro porque só eles detêm os direitos autorais das torres. A paranoia é tanta que, quando fui tirar uma foto, ainda do lado de fora, mas já com uma das portas abertas, a guia fez cara feia e não deixou eu fazer a foto. Enfim, tudo isso pra dizer que essas fotos aí embaixo eu peguei no site da Berliner Unterwelten, ok?
A Flakturm III foi uma fortaleza nazista que tem cinco andares e durante seus anos de funcionamento a divisão era a seguinte: nos dois primeiros andares ficava o bunker. A estrutura garantia que até 15 mil pessoas (!!!!) pudessem ficar lá dentro com todas as instalações necessárias. Quartos, banheiros, cozinhas, refeitórios, hospitais, escolas e até um salão de baile, com música ao vivo.
O terceiro andar era usado pela inteligência da força aérea alemã. Ali, os militares monitoravam os radares para saber quando os aviões das tropas aliadas entrariam no espaço aéreo de Berlim. Toda vez que isso acontecia, um sinal era emitido pro quarto andar, onde ficava o estoque dos armamentos. Tudo era preparado ali e enviado pro quinto e último andar, onde ficavam as armas propriamente ditas. As baterias anti-aéreas eram compostas por várias metralhadores gigantescas (afinal, a ideia era derrubar aviões, certo?), sendo que a maior delas precisava de inacreditáveis 22 soldados para manuseá-la.
Com toda essa parafernália, você deve pensar - assim como eu pensava até a minha visita - que a Flakturm III foi o terror dos pilotos de avião e responsável pela derrubada de inúmeras aeronaves. Porém, não foi bem o que aconteceu. Na verdade, essa fortaleza nazista foi um dos maiores fracassos da Alemanha. Durante os 5 anos em que esteve ativa, só 16 aviões foram abatidos pelos soldados dela. Um número vergonhoso, levando-se em conta a quantidade de ataques que Berlim sofreu durante aquela época.
Nossa entrada foi feita pelo topo da torre, no quinto andar. Ainda é possível ver o suporte das armas e os inúmeros buracos causados pelas bombas dos aliados e também dos alemães, ao tentar derrubá-la.
Dentro da torre, toda a estrutura é de fato absurda. Dutos de ar-condicionado, água corrente, túneis para a passagem de comida e armamentos. Tudo foi pensado detalhadamente para funcionar em situações extremas.
Pra se ter uma ideia, 4 metros de concreto maciço separam um andar do outro, e essa é a mesma medida das paredes. Agora dá pra imaginar o porquê dessa torre nunca ter caído, mesmo sob bombardeiro proposital!
À medida que vamos descendo pelas escadas, o guia vai falando o que exatamente acontecia em cada lugar, sempre ilustrando com fotos da época, pra que pudéssemos comparar com o que existe hoje.
O negócio é tão sinistro que, não importa qual seja a temperatura em Berlim, lá dentro sempre vai fazer 8 graus. Mesmo no auge do verão, eles recomendam que você vá bem agasalhado para esse passeio. E esse frio faz tudo fica mais intenso, acredite. O impacto de saber que um monte de gente morreu ali em nome de um regime político absurdo te faz pensar em várias coisas, é inevitável.
Outra recomendação é que você não tenha medo de morcegos. Isso porque eles estão por toda a parte nos andares inferiores. Eu não sou muito fã desses loucos mamíferos voadores e acho que dei sorte, já que eles não pareceram muito agressivos no dia em que estive lá.
Lembrando novamente que essas fotos aí em cima não são minhas! Estão lá no site do Berliner Unterwelten!
Hoje em dia, é muito fácil pra gente olhar pra trás e imaginar que nada daquela maluquice nazista daria certo. Mas a história está aí pra comprovar que eles, de fato, acreditavam - e muito - em todo aquele papo de dominação do planeta. E ainda foram megalomaníacos a ponto de traçarem vários planos para o pós-guerra, na esperança da vitória.
A Flakturm III foi uma parte bem importante desses planos. Uma das coisas que mais me chamou a atenção durante o tour foi o fato da torre ter inúmeras janelas, em todos os seus andares. Veja bem, imagine que você esteja construindo uma fortaleza para defender a sua cidade, porque você faria janelas e tornaria sua construção vulnerável?
A explicação pra isso é tão simples quanto patética. A certeza do triunfo fez com que os alemães pensassem no que fazer com as torres ao final da guerra. A Flakturm III foi escolhida para ser sede de um grande complexo de convivência para os moradores de Berlim; um lugar onde todos poderiam se encontrar para passar o tempo e se divertir com suas famílias e amigos. Talvez algo parecido com os shopping centers aqui em São Paulo.
A confiança era tanta que um imenso lote de granito sueco foi comprado pelos nazistas para revestir o prédio por fora e mascarar os buracos causados pelas bombas. E essas inocentes pedras suecas acabaram sendo mais um motivo de grande vergonha pros nazis.
Vou explicar: logo que a derrota alemã se consolidou e a Flakturm III foi desativada, os soviéticos encontraram esse enorme carregamento de granito, encostado num depósito e sem utilidade. E o que fazer com elas? Fácil: construir um enorme monumento em homenagem aos 80 mil soldados soviéticos que morreram na Batalha de Berlim e deram suas vidas para derrotar a Alemanha nazista, entre abril e maio de 1945.
Agora imagina comigo: de celebração à vitória alemã, as pedras foram parar na comemoração soviética. Certamente o maior pesadelo que um nazista poderia imaginar.
Esse monumento fica dentro do Treptow Park, na região leste de Berlim. Assim que terminou o tour na Flakturm III e eu soube dessa parte da história, corri pra lá no mesmo dia.
Consegue imaginar o quão legal é ter dois pontos históricos tão perto? Isso pode ser decisivo pra você escolher aonde se hospedar na próxima viagem a Berlim. E a melhor maneira de você encontrar hotéis baratos em Berlim ou hotéis baratos na Alemanha, é usando o Detecta Hotel. A ferramenta de busca e comparação deles é imbatível, e os caras ainda têm um app pra iPhone e Android que facilita ainda mais a vida dos viajantes.
Na verdade, o monumento faz parte de um gigantesco memorial soviético e que também é um dos maiores cemitérios da Europa. Lá estão enterrados 5 mil dos soldados mortos nessa última batalha que aconteceu em Berlim.
O granito sueco foi usado em dois imensos arcos do triunfo soviético e ambos possuem a estátua de soldados ajoelhados, em reverência à pátria. Do outro lado do memorial, há um pequeno mausoléu com um lindo mosaico com figuras representativas da União Soviética lamentando os mortos, mas orgulhosos da vitória.
Acima desse mausoléu, uma estátua de 11 metros mostra um soldado segurando uma criança no braço esquerdo e uma espada no braço direito. Essa espada está quebrando ao meio a suástica nazista, não deixando dúvidas do fracasso do regime.
Tudo muito imponente, de verdade.
O Viagem Criativa viajou a Berlim com o apoio do Detecta Hotel
15 Responses